segunda-feira, maio 07, 2012




- Olha só, eu não tô te cobrando nem nada, ok. – Ela se ajeitou na cadeira. – Mas, tenho uma curiosidade... porque você nunca disse que me amava?

Ele riu.

- Não é engraçado. – ela arqueou a sobrancelha.

- Eu nunca disse que te amava, porque eu nunca achei que fosse necessário. Mesmo porque, eu não entendo muito de amor.

- Mas então, porque você quis ficar tanto tempo do meu lado?

- Porque eu te adoro.

- Adora? Assim, no presente?

- É. – ele riu de novo, tomou um gole da soda italiana de maçã verde e voltou a falar. – Adorar, acho, é o sentimento mais intenso que se pode ter. Mais do que amor.

- Adorar, tipo Deus?

Ele ficou levemente constrangido, levou a mão até a barba rala e coçou como fazia quando pensava duas vezes antes de dar uma resposta.
- Não é tipo Deus, mas é. Eu não rezava para você, mas todas as vezes que conversava sobre você com alguém, dizia o quanto você era uma parceira incrível, o quanto estar ao seu lado me fazia bem, o quanto você era uma pessoa justa, inteligente, charmosa. E todas as vezes que estava sozinho, me pegava pensando em você.

Ele continuou.

- Eu não louvava você. Mas cansei de cantar pra você no violão, olhando nos seus olhos pra ter certeza que você sabia. Que você entendia que todas aquelas palavras bonitas, escritas por outra pessoa, tinham pra mim um significado especial, que elas tranquilamente poderiam ter sido escritas por mim, pensando em você. E eu não ia a igreja nos domingos, mas eu ia pra casa dos seus pais, almoçar com a sua mãe e provar para o seu pai que tudo o que eu mais queria era ficar perto de você, mesmo passando as tardes assistindo ao jogo do São Paulo e aguentando gozação dos amigos depois.

Dessa vez foi a vez dela rir.

- E eu não fiz guerra por você, mas você sabe todas as discussões que eu tive com a minha mãe quando ela me dizia que você ia me trocar por um cara mais velho, mais bonito, mais rico. E eu ainda tenho alguns hematomas das vezes que eu tive que apanhar de alguém na balada pra não deixar ninguém encostar em você.

Ela baixou o rosto.

- Adorar é tipo colocar alguém num lugar mais alto do que o seu. Tipo uma escadinha, onde você está feliz só por ficar olhando lá de baixo. É perceber todas as qualidades, apreciar todos os defeitos, e ser feliz por ter feito a escolha certa de estar ali. E não é porque você me trocou por um advogado rico, famoso e bem mais bonito do que eu que eu vou deixar de achar isso. Mesmo porque, eu sei que você me trocou por amor. Por isso ainda somos amigos.

Ela acendeu um cigarro, desconfortável. A franqueza com que ele falava as coisas costumava ser sempre desconcertante.
- Você é feliz? – ela perguntou, baixo.

- Felicidade é poder escolher. Eu sou um cara de sorte. Pude escolher me envolver com as pessoas certas, pude escolher meu trabalho, pude escolher minha família. Eu não olho pra trás e penso “e se?”. Eu construi, eu vivi, e eu tomei minhas decisões da forma mais sincera que eu pude, e não faria diferente.

- E se nós ainda estivéssemos juntos?

Ele a olhou nos olhos, um sorriso doce nos lábios.

- Se nós ainda estivéssemos juntos, você não seria quem você é hoje. E eu não seria quem eu sou. Não teríamos tido os momentos de decisão que seguiram nossa separação até hoje. Não teríamos feito as escolhas que fizemos. Talvez nem tivéssemos a mesma relação que temos, nem a que tínhamos. Eu sou feliz, assim, e não acho que poderia ser de outra forma.