terça-feira, abril 03, 2007

O Tempo.

Tempo.

Havia um cigarro, e haveria também quem o tragasse. O cigarro, fumo e nicotina embrulhados num papel longo e branco, com o fundo amarronzado e seu limite demarcado por um pequeno traço – até onde poderia se por a boca, recebia a marca do batom róseo da mulher de lábios finos e delineadores mal utilizados. Ela parecia sugar com alguma pressão a fumaça para dentro dos pulmões já provavelmente enegrecidos pelos males do vício antigo.

Na mesa, a sua frente, repousava uma revista sobre design. Ela tentava folhear com a ponta de um dos dedos livres enquanto o café sobre a outra página, dentro de uma pequena xícara formava uma pequena bolha de calor. No seu pulso, o relógio caro de vidros safira e pulseira de couro marcava, com suas duas setinhas e algo que se assemelhava a um bastão o tempo do dia. Quatorze horas, trinta e três minutos e oito segundos.

Ao seu lado, o vento parecia curvar-se para bagunçar os cabelos relativamente longos e louros de uma criança de pé junto a máquina de refrigerantes. O menino parecia observar com atenção cada uma das opções, todas ao mesmo tempo, como um plano geral de um filme pouco trabalhado, e buscar em sua mente por uma escolha. Sabe-se disso pela direção dos olhos, o franzimento da testa, a indecisão do pezinho que em breve, provavelmente, se chocaria contra os ladrilhos do chão pedregoso. Era gesto comum em quem não sabe direito o que quer do seu segundo, porém, justo quando visto em uma criança que ainda teve poucos segundos para entender.

Pouco adiante, a mão tocava com as mãos calejadas do trabalho matinal a cadeira alva do hall, em uma mesa ao canto, quase como se sentisse protegida junto à parede. Os dedos claramente forçavam o material sintético do qual o assento era construído, a pele se contorcia, formando pequenas ondas disformes, dada à pressão. A bolsa lhe pendia por um dos ombros, em descendência direta, rumo ao chão. Sabe-se que dentro da bolsa dela, como de qualquer outra mulher, provavelmente existiriam dezenas de pequenas coisinhas de significância razoável que talvez se espalhariam pelo chão tomando os segundos de outras pessoas que, simpáticas a figura solitária materna, decidissem auxilia-las a recolher do chão seus infortúnios.

Do lado de fora, o céu escurecido anunciava a chegada de água. Uma parte mais iluminada entre duas nuvens negras traçava a forma de uma raio e quase chocava-se contra uma outra parte indistinta do horizonte. Não fazia som, no entanto. Ainda. Se pudéssemos ver com mais clareza, ficaríamos espantados com o número de gotículas de água que desprendiam-se ao mesmo tempo do composto gasoso e tombavam verticalmente.

Os ponteiros do relógio então pareceram enervar-se. Rompiam a funcionalidade do tempo eterno e rebelaram-se contra as diretrizes da racionalidade. De forma súbita, a chuva de cem chuvas iguais aquela passou como um raio, sem raios mais veloz que aquele. A mulher virou uma mulher cem anos mais mulher que aquela e seu café voltou a ser grão, de perfume cem vezes mais enebriante que o grão original, a mãe virou filha cem anos mais experiente que aquela, e a criança tornou-se adulta cem vezes mais adulta que as outras. O cigarro se desfez em cinzas, que o vento cem vezes mais forte que todos os outros tratou de carregar em seus braços para cem distâncias mais distantes do que as que ele estava acostumado.

O final é sem fumaça. E na bolsa guardam-se sonhos.

Tempo.

Um comentário:

Lani Romée disse...

Vou comentar só pra não ficar chato.

Ficou uma merda, Gabs. Tem trechos que nem dá pra entender, não adianta ficar jogando termos sem sentido só porque você acha que vai ficar bonito. Porque não vai.

E a crase vai mal, heim?